Eu, singela leitora, enquanto leio, no silêncio me refugio.
E , numa noite serena de inverno, emergiu aos meus ouvidos o bulício
De dois poetas maiores que, sobre seus destinos amargurados,
Discutiam. Quedei a leitura e embrenhei-me em seus fados .
“Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu.
Assim vivo, Meus fados
Me desarreigam d'alma a paz e o riso,
Vinde cá, meu tão certo secretário
Já me desenganei (…) de queixar-me,
Não se alcança remédio…
Como tu, junto ao Ganges sussurrante
Da penúria cruel, no horror me vejo.
Eu não, mas o Destino fero, irado,
Fez-me deixar o pátrio ninho amado,
Passando o longo mar, que ameaçando
Tantas vezes me esteve a vida cara.
Mas, já que para errores fui nascido,
Vir este a ser um deles não duvido.
Como tu (…)
Também carpindo estou
Sem causa, juntamente choro e rio;
O mundo todo abarco e nada aperto.
Se me pergunta alguém porque assim ando,
Respondo que não sei;
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo
As sem-razões digamos que, vivendo,
Me faz o inexorável e contrário
Destino,
Sacrifiquei a vida a meu cuidado.
Eia! Acode ao mortal que, frio e mudo,
Oculta o pátrio amor.”
E eu acordei deste êxtase de dor,
Acudi a Bocage e a Camões
E ingressei no seu universo de paixões.